domingo, maio 13

Conto - A Lenda do Duende Ladrão




O primeiro conto do blog.
Espero que gostem...
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😊😊😊


A Lenda do Duende Ladrão



Não havia, naquela aldeia, quem não conhecesse e temesse a lenda do duende ladrão, que contava que no silêncio mais bravio da noite os duendes saiam da sua aldeia escondida na floresta e entravam nas casas para roubar.
Para protegerem as suas coisas, os aldeões trancavam tudo, portas, janelas, chaminés, todos os lugares possíveis que os duendes podiam usar para entrar. E nas noites de lua cheia, nem dormiam, pois segundo a lenda os duendes seriam mais agressivos e traiçoeiros.
Numa noite destas, três velhos amigos decidiram pernoitar na casa do mais novo para festejarem o seu aniversário e à mesa nada faltou; havia bolo, bolachas, salgadinhos, vinho e cerveja. Pouco estavam preocupados com os duendes, pois à conta da lenda sabiam que eles detestavam barulho.
O que eles não sabiam era que um dos duendes gostava exatamente do oposto e que no momento em que a conversa deles chegara a meio, este entrara pela janela deixada aberta e escondera-se debaixo da mesa.
- Foi mesmo engraçado – comentou o do meio, entre gargalhadas. – O amigo fez muito bem impedi-lo!
- Eu não fiz nada de mais… – disse o mais velho, ao beber um gole do seu copo de vinho. – Ele não devia ter exaltado o nosso amigo daquela maneira. Todos sabemos que é bastante agressivo quando algo não lhe corre bem…
- Isso já passou – disse o mais novo, sacudindo a mão de trás para a frente. – Isso agora não importa mais! Não sou homem de me importar com algo que já passou.
- Lá nisso… – murmurou o do meio, bebendo o que lhe restava da sua cerveja.
- Mais uma? – perguntou o mais novo, inclinando-se para lhe entregar uma outra garrafa. – Ainda está fresca!
- Não, obrigada. Prometi há minha mulher que não chegava a casa a dançar e a cantarolar esta noite.
- Que tolice – resmungou. – Estamos a festejar…
- Sabem uma coisa – começou o mais velho, bebendo mais um gole do seu copo de vinho. – Noutro dia encontrei uma nota de cinquenta euros no chão e depois de pensar um pouco no que devia fazer com ela, devolvi-a ao dono.
- Que disparate! – comentou o mais novo, que já ia no seu décimo copo cheio. – Eu, se a tivesse encontrado, tê-la-ia gastado.
- Pois então fiz mal? – perguntou.
- Com certeza – respondeu prontamente, ao encher o seu décimo primeiro copo. – Eu tê-la-ia gastado em vinho bom que nem este!
- Isso está errado – afirmou o do meio. – Isso é ser desonesto. É um roubo!
Surpreendidos, os dois amigos olharam-no.
- Aqui, os únicos ladrões são os duendes! – exclamou o mais novo, ofendido. – São eles que entram nas nossas casas e vasculham as nossas coisas… Eu nunca fiz uma coisa dessas! Achado não é roubado!
- Talvez tenha razão… – murmurou o mais velho, pensativo. – Se calhar, não lhe teriam feito assim tanta falta!
- Está enganado! – insistiu o do meio, com uma expressão séria no rosto. – De certeza que ajudou quem o perdeu.
- Que disparate! – exclamou o mais novo, cada vez mais exaltado. – A filha do nosso amigo faria melhor farinha dele! Para sustentar aquele preguiçoso…
Ao fixar o amigo, o do meio perguntou:
- E se fosse uma nota deixada pelos duendes? Eles voltariam por ela… São gananciosos e o amigo acabaria por ser amaldiçoado por eles.
Os dois amigos olharam-se.
- Não era – afirmou o mais velho. – A nota pertencia aos velhotes que moram no fim da aldeia!
- Estás a ver, estás a exagerar! – comentou o mais novo, arrotando logo de seguida. – Os duendes não são assim tão desleixados!
- Pois é! O amigo não devia ser tão certinho. O casal, de certeza, nem precisava dele – disse o mais velho, bebendo o seu vinho.
O velhote do meio respirou fundo e depois perguntou ao mais novo:
- Então, se encontrasse uma nota de cinquenta euros no chão, gastá-la-ia? Não hesitaria em gastar um dinheiro que não lhe pertencia? O amigo não devia ser tão avarento. Isso, tal como disse ainda há pouco, é ser desonesto!
- Claro que não – respondeu, dando uma gargalhada. – E eu não sou avarento!
O mais novo voltou a encher o seu copo e bebeu de uma só vez. O mais velho fez o mesmo logo de seguida. O do meio olhou-os, admirado.
- A minha neta já nasceu – disse o mais novo, a certa altura. – Possui lindos cabelos de ouro e duas safiras azuis no lugar dos olhos. É lindíssima!
- Sim, é mesmo linda – comentou o mais velho. – Fui vê-la na semana passada, quando nasceu. É tal e qual um dia de sol…
- Eu também fui vê-la quando nasceu. Sim, é muito bonita, meus parabéns! É igualzinha à mãe…
- Nada disso! – exaltou-se. – A minha neta é a cara do pai!
E assim passaram a noite, na conversa e a beber, enquanto o duende, atento a cada palavra dita, decidiu dar uma lição ao mais novo. Os duendes roubavam, mas tinham uma boa razão para os seus ditos crimes: todos os anos, naquela época fria, sofriam com uma grande escassez de alimento, algo que precisavam para sobreviver, e qualquer outra coisa desaparecida na aldeia não tinha mão de duende. Eram ladrões honestos e orgulhavam-se de o ser, e determinado a ensinar-lhe a ser também honesto, arquitetou um plano.
Numa noite, o mais novo dos três amigos pagou bebidas a todos os homens da aldeia. Não houve quem não estranhasse tamanha simpatia e aquela quantidade exagerada de dinheiro, o que fez com que a certa altura, o mais velho lhe perguntasse, por curiosidade, onde arranjara tanto dinheiro e a sua resposta foi tão chocante que nem o do meio teve a coragem de dizer fosse o que fosse:
- Não me olhem assim, eu não o apanhei do chão. Eu não o roubei! A minha nora deixou-me uma nota de cem euros no berço da Maria, quando foi à feira. Ninguém o perdeu, simplesmente deram-mo! A minha nora é tão generosa…
- Mesmo! – exclamou o mais velho, surpreendido, quando este se retirou para pedir mais uma garrafa de vinho. – Então, está tudo bem! Beba, meu amigo, ele não ficou com nada que não era dele.
Incomodado, o velhote do meio não bebeu mais nada e retirou-se, para surpresa de todos. Ele achava muito estranha toda aquela história e por isso decidiu que na manhã seguinte visitaria a nora do seu amigo.
Ainda fragilizada, recebeu-o com um sorriso e após algumas perguntas sobre o seu bem-estar e da recém-nascida, ouviu algo que a deixou sem palavras:
- A senhora é muito generosa por dar tanto dinheiro ao seu sogro… Foi realmente uma boa recompensa pela ajuda que ele tem dado para com a Maria.
Não precisou dizer mais nada para compreender o que possivelmente tinha acontecido: o seu amigo encontrara o dinheiro no chão e não o devolvera. Desapontado, decidiu chama-lo novamente à razão, algo que não surtiu qualquer efeito, já que este teimava na história da nota no berço.
Só anos depois, com a recém-nascida a fazer treze anos, é que todos ficaram a saber de onde viera aquele dinheiro. O próprio duende revelou que aquele dinheiro fora deixado por ele como pagamento do dote para o seu casamento com Maria e que era algo que os duendes costumavam prometer aos familiares da noiva como prova do seu valor.
Explicou ainda que ao aceitarem tal oferenda, os familiares mostravam contentamento naquela união e que havia esperado ansiosamente pela idade adulta da sua noiva, treze anos realizados.
Exaltado, o avô de Maria ainda tentou devolver o dinheiro gasto na bebida, mas o duende, espertalhão, respondeu:

Achado não é roubado
E no chão não foste encontrar,
Mas sim no berço deste tesouro
A quem eu soube salvaguardar.

Àquele que ao dinheiro mais quer
Uma fortuna perdida vai encontrar,
Pois na vida nada é achado
Mas sim encontrado a quem procurar.

Avarento, de certeza não o és,
Mas a honestidade não a sabes pintar,
O dinheiro que gastaste em bebidas
Vou eu agora, feliz, disfrutar!

Abanaste a mãozinha de leve
Para o passado não te importunar.
Eu, agora, vitorioso e satisfeito,
Com a tua neta vou casar!


E sem dizer mais nada, o duende partiu, levando a sua noiva ao colo, a quem nunca nada lhe faltou. Quando engendrara o plano, de deixar o dinheiro no berço e ver o que acontecia, havia sido apanhado de surpresa por aquele tesouro, algo que nunca vira tão belo, e é verdade – não existe maior e mais belo tesouro no mundo do que o verdadeiro amor.

FIM…
(Borboleta Voadora, Portugal, 13-05-2018)


Um abraço e até à próxima.


Borboleta Voadora
😊😊😊

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